sábado, 17 de maio de 2008


                                               Na noite

      Vem de longe este velho barco.
      E no velho mastro, na sua velha vela rota,
      que o vento às vezes ainda infla,
      vêem-se já os sinais de todos os seus cansaços.

      Mas, para onde vai,
      e de onde vem essa ânsia de mar alto;
      esse fugir de todas as praias habitadas,
      de todas as ilhas paradisíacas;
      esse querer o turbilhão e a solidão
      das mais impossíveis vagas elevadas?
      Talvez de um distante cais ancestral,
      talvez da brisa maternal que o embalou
      por demais longe de todos os perigos dos rochedos;
      talvez, não da ânsia de conquistar mundos novos,
      mas da mais pura cobardia.

      (E assim, como se não bastasse a solidão e a tormenta,
      há um duradouro momento na imensa noite navegante
      no qual o velho barco sente-se apenas a fugir
      e não a navegar contra a corrente).

      Noite, noite voraz:
      o velho barco triste apenas paira no horizonte,
      enquanto um sol agoniza o seu agouro,
      longe, lá no mar poente.

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