Por que escrever? Cada um tem suas razões: para este, a arte é uma fuga; para aquele, uma maneira de conquista. Mas pode-se fugir para o claustro, para a loucura, para a morte; pode-se conquistar pelas armas. Por que justamente escrever, empreender por escrito suas evasões e suas conquistas? É que existe, por trás dos diversos desígnios dos autores, uma escolha mais profunda e mais imediata, que é comum a todos. (...)
Cada uma de nossas percepções é acompanhada da consciência de que a realidade humana é “desvendante”; isto quer dizer que através dela “há” o ser, ou ainda que o homem é o meio pelo qual as coisas se manifestam; é nossa presença no mundo que multiplica as relações, somos nós que colocamos essa árvore em relação com aquele pedaço de céu; graças a nós essa estrela, morta há milênios, essa lua nova e esse rio escuro se desvendam na unidade de uma paisagem (...); a cada um dos nossos atos, o mundo nos revela uma face nova. Mas se sabemos que somos os detectadores do ser, sabemos também que não somos os seus produtores (...). Assim, à nossa certeza interior de sermos “desvendantes”, se junta aquela de sermos inessenciais em relação à coisa desvendada.
Um dos principais motivos da criação artística é certamente a necessidade de nos sentirmos essenciais em relação ao mundo.
Jean-Paul Sartre, in "O que é a literatura?"